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    Você acreditou em 2014?


    Antes de junho de 2013, confesso que imaginava 2014 como uma espécie de “o ano” do Brasil. Copa do Mundo no horizonte, Olimpíadas mais adiante, propagandas e mais propagandas do Pré-Sal... Tudo que era divulgado me encantava, pois não me pareciam coisas fáceis de conquistar. Tinha fé que, enfim, abandonaríamos aquele já tão gasto complexo de vira-latas. Confesso, com uma pontinha de vergonha, que acreditei naquela famosa capa da Economist (“Brasil decola”). Claro, isso foi antes de junho do ano passado, dos protestos e tudo mais. Depois, a própria Economist tratou de mudar o discurso (“O Brasil estragou tudo?”). A partir disso, mudei, mas segui positivo. Pensei que seria o ano da virada, afinal, era isso que apontavam alguns “especialistas”, que teceram páginas e páginas sobre como seria o futuro da nação. O marco zero das mudanças significativas de um país que precisa de mudanças significativas. Futuro, ressalto, seria 2014.

    Teve Copa, sim (ao contrário do que pessoas gritavam nas ruas), e eu acreditei que o Brasil tinha alguma chance. Ganhamos a Copa das Confederações, um ano antes, passando por cima da Espanha, melhor seleção até então. Seguimos cantando juntos o hino nacional, pois deu sorte. Mas choramos demais, torcida e jogadores. Sabe como é, brasileiro é muito emotivo. Em 1950, já tinha sido assim. No fim, tomamos 7 a 1 da Alemanha, a campeã do torneio, e acabamos em quarto lugar. Para alentar, a Argentina perdeu a final, foi vice. Seria muito mais dolorido ouvir por anos e anos aquela musiquinha “Brasil, decime que se siente/ Tener en casa a tu papá (...) Maradona es más grande que Pelé”.

    Entretanto, tudo que a Copa do Mundo traria consigo, o tal “legado”, ainda não aconteceu. Continuamos tropeçando e desviando dos canteiros de obras inacabadas (não esqueçamos o viaduto que desabou em Belo Horizonte, matando duas pessoas e ferindo dezenas, em julho), que estão no meio do caminho e seguirão para além desse fatídico ano. Talvez sejam concluídas em 2015, mas não criemos mais expectativas. As eleições foram bem claras nesse sentido. A presidencial, mais acirrada desde 1989, inclusive, acabou com muitas amizades nas terras sem lei do Facebook e Twitter. Mas nada mudou. Dilma Rousseff manteve-se onde está. O PMDB continua com a maior representatividade na Câmara. E o termo “governabilidade” ainda será muito ouvido por aí.


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    A corrida para a presidência teve o engomado Aécio Neves, com seu sorriso colgate, que quase convenceu. Teve a morte do candidato Eduardo Campos, em meio à campanha, vítima de um acidente aéreo. Teve Marina Silva, alçada em seu lugar, que disse, desdisse e acabou não dizendo. Teve Levy Fidelix e sua frase bizarra “o órgão excretor não reproduz”. E teve a rebelde Luciana Genro, do Psol, com seu clássico “linha auxiliar do PT uma ova!”. Mas que acabou votando em Dilma... Aliás, nossa presidenta foi um caso à parte. Gaguejou em todos os debates da televisão (também conhecidos como debates-boca) e, em um deles, sugeriu que uma economista desempregada fizesse um curso no Senai. Não é fácil estar na situação...

    Também tivemos (olha eles de novo!) os líderes de junho de 2013, os jovens que apontavam um novo caminho, uma nova forma de fazer política. Eles se reuniram outra vez. Foi exatamente na campanha eleitoral, em outubro, mas dessa vez para pedir voto a Dilma, em sua propaganda de TV. Ninguém imaginava apoio a Aécio Neves, segundo colocado nas eleições presidenciais. Mas que confundiu muita gente, isso confundiu. Pessoal não era contra o governo? Não era bem assim... Veja bem... Bom, com esse apoio escancarado, os líderes de junho, enfim, foram claros: queriam mudar não mudando. Me enganei, ou fui enganado, novamente. Mas o povo parece que entendeu e manteve Dilma. Vamos aguardar.

    Para encerrar (de vez?) nossa revolução-ejaculação precoce, extremistas black blocs assassinaram, em fevereiro, com o lançamento de um rojão em uma manifestação, o cinegrafista Santiago Andrade, da TV Bandeirantes. Era o fim dos intolerantes. Não, infelizmente não era. Após as eleições, uma dúzia de pessoas, em passeatas ou caminhando a esmo por aí, pediram a volta da Ditadura Militar (renomeada para “intervenção militar”), nos moldes de 64. Lamentável. Melhor sermos lembrados pelos 20 centavos.

    Em 2014, os casos de corrupção seguiram pipocando. Tivemos o maior de todos, na Petrobras, revelado pela Operação Lava-Jato (essa Polícia Federal e seus nomes de operações...). Tudo começou com indícios de superfaturamento na compra da refinaria de Pasadena, nos EUA. Veio uma CPI. Um ex-diretor da estatal e um doleiro foram presos pela PF. Assustados com a previsão de suas penas, decidiram jogar no ventilador e entregar megaempresários e políticos. Pronto. Surgiu o mais escandaloso esquema de corrupção da história do Brasil. Cifras estratosféricas, a deixar os mensalões do PT (que simpatizantes do partido dizem que nunca existiu) e do PSDB (que simpatizantes do partido dizem que nunca vai existir) em segundo plano, como se fossem brincadeira de criança. E as investigações ainda vão longe.

    Deixemos o Brasil de lado. O mundo também tem seus problemas. A guerra Israel x Palestina persiste no Oriente Médio. E, neste ano, veio com mais força. Milhares de civis já foram mortos, e a paz parece que não vai reinar tão cedo. Outra triste notícia que chega de lá, mais precisamente do Iraque, é afirmação do Estado Islâmico, existente desde 2006, mas com maior visibilidade em 2014, em razão da degola de diversos prisioneiros estrangeiros. E o pior: o grupo mobiliza jovens de vários países para sua causa, via internet. No apagar das luzes do ano, milicianos talibãs mataram mais de 130 crianças em uma escola pública em Peshawar, Paquistão, para “se vingar” do exército do país. E, veja só, Cuba e os Estados Unidos se reconciliaram. Obama anunciou, e Raul Castro confirmou, o restabelecimento das relações diplomáticas, cortadas em janeiro de 1961. Agora, só falta saber quem perdeu (ou ganhou, depende do ponto de vista): o “imperialismo” ou o “comunismo”?

    Em março, outro fato importante: um avião da Malaysia Airlines, com 239 pessoas a bordo, desapareceu. As autoridades encerraram as buscas sem encontrar vestígios do paradeiro da aeronave. O acontecimento, muito triste, gerou teorias da conspiração (onde? onde?) na internet. Na Europa, o líder russo, Vladimir Putin, invadiu a Crimeia e a Ucrânia, como nos velhos tempos de União Soviética. Parece que nada mudou por lá também. Na metade do ano, um novo surto do vírus Ebola assolou países da África (Libéria, Guiné, Serra Leoa e Nigéria, principalmente), ocasionando milhares de mortos. O vírus não se dissipou mundo afora, mas a desinformação e o preconceito, sim, muito por causa da (lá vem ela de novo...) internet.

    Por essas e outras, que, em 2014, decretaram de vez a morte do Orkut. Mas, daí, teve o famoso selfie na premiação do Oscar, o desafio do balde de gelo, e todo mundo voltou para as redes sociais. Lugar em que reina a bobagem (tem coisa boa, claro, mas não é, nem de longe, a maioria do conteúdo compartilhado). Como adoro bobagens, separei algumas delas: o beijo gay de homens, na novela “Amor à vida”, da Rede Globo. O amasso aconteceu entre os personagens de Mateus Solano e Thiago Fragoso. Outro tema que “viralizou” foi Roberto Carlos não comer carne no comercial da Friboi. O casalzinho Neymar e a Bruna Marquezine também poluiu bastante as timelines Brasil afora. Teve o “Somos todos macacos”, uma resposta do jogador Daniel Alves ao racismo que sofreu na Espanha. A frase virou hashtag, até descobrirem que se tratava de uma pífia jogada de marketing do homem de bem e apresentador de TV Luciano Huck. Ah, a internet! Mas nela você ouviu discos novos de bandas velhas, que saíram este ano, como Pink Floyd, Racionais MCs, Titãs, AC/DC... E o Pharrel Willians, com a matadora “Happy”, que você certamente cansou de dar play.

    Teve uma que não esqueci: Galvão Bueno falou que se aposentaria neste ano. Seria depois da Copa do Mundo. Porém, mudou de ideia. Assim fica difícil, acreditei em tanta promessa deste 2014... Fui um trouxa, como aquele cara do comercial (veiculado neste ano, inclusive) que ouve perplexo a sentença de Compadre Washington: “Sabe de nada, inocente!”

    Obituário – Muita gente boa e reconhecida se foi neste ano. O cineasta Eduardo Coutinho, considerado por muitos o maior documentarista do país, morreu em fevereiro. Do cinema, também morreram os atores Philip Seymour Hoffman, Robin Williams, José Wilker, Hugo Carvana e o diretor Mike Nichols, do clássico “A primeira noite de um homem”. Na música, nos deixaram Jair Rodrigues, Nelson Ned e o argentino Gustavo Ceratti, vocalista do grupo Soda Stereo. Grandes escritores faleceram, como Gabriel García Márquez, Ariano Suassuna, Rubem Alves, João Ubaldo Ribeiro e o poeta Manoel de Barros.

    No futebol, os torcedores vão sentir a ausência dos craques Bellini, capitão da conquista de 58 pelo Brasil; Eusébio, o pantera negra, estrela do Benfica; Alfredo Di Stefano, uma dos maiores jogadores argentinos de todos os tempos e atacante do Real Madrid; e Fernandão, capitão da conquista do Mundial de Clubes pelo Internacional. Mas, talvez, a morte mais sentida pelos brasileiros tenha sido a de um mexicano: Roberto Bolaños, criador e ator dos seriados Chaves e Chapolin Colorado, entre outros, transmitidos há muitas décadas pelo SBT, que cativou, e segue cativando, milhares de crianças com seu humor sem apelos e leve, deixou seus fãs no dia 28 de novembro. Personalidades e ideias morreram em 2014. O que nascerá no lugar? Quem sabe 2015 mostre um novo caminho. Vamos ver...

    @lsbarroso


    lucas barrosoLucas Barroso

    Jornalista e escritor, autor de "Virose" (2013), "Um Silêncio Avassalador" (2016), "Um Gato Que Se Chamava Rex" (2018) e "O Tempo Já Não Importa" (2020).



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