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    Direita - Esquerda - Pare


    Dias atrás, não sei por que motivo (maldito inconsciente...), vieram-me à cabeça algumas lembranças do meu período de estudante universitário. Lembrei-me, por exemplo, do discurso político simplista de certos colegas, que, anos e anos depois da queda do Muro de Berlim, ainda dividiam o mundo entre “direita” e “esquerda” (volver!). Vários deles, na época, me indagavam se eu me considerava de direita ou de esquerda. Eu sempre pensava: “my gosh, essa gente será jornalista e não percebe que a realidade é muito mais complexa do que isso”. Mas tentava argumentar: se ser “de esquerda” é ser contra o capitalismo, apreciar Karl Marx, concordar com os discursos de Hugo Chávez, Evo Morales e Fidel Castro e pensar que o mensalão do governo Lula “se justificou porque era em nome da causa”, certamente não sou. E se apoiar George W. Bush e a guerra do Iraque, ter uma moral católica – defender sexo só depois do casamento, condenar aborto, eutanásia e pesquisas com células-tronco – e acreditar que o estado nunca deve intervir no mercado é ser “de direita”, então também não sou. Para mim, a questão não é tão maniqueísta assim: “ou se é de direita, ou de esquerda”. O buraco é (sempre) mais embaixo. Qualquer visão “de direita” ou “de esquerda” não dá conta da multiplicidade da realidade. Pessoas de cabeça elegante, como já escrevi, têm consciência de que o mundo não se resume a Bush versus Chávez.

    Eu, até por falta de opção, já votei no PSDB e no PT, mas nunca em candidatos envolvidos em casos de corrupção ou com pífio currículo de realizações políticas. Se eu vivesse nos Estados Unidos, votaria no Partido Democrata. Se vivesse na Inglaterra, votaria no Partido Trabalhista. Defendo a democracia, a liberdade de expressão e as liberdades individuais. Penso que qualquer pessoa pode fazer de sua vida o que bem entende, desde que, claro, não fira nenhuma regra da sociedade em que se insere. Não gosto de nenhum tipo de autoritarismo. Acredito que o estado brasileiro deveria ser reduzido; os investimentos em infra-estrutura, aumentados; e as leis trabalhistas e os impostos, reformados. Acho que a burocracia atravanca o país e que a nossa educação está a anos-luz de ser considerada boa. Também acho que o problema da segurança pública não se resolve apenas com repressão ao crime, como defende a “direita”, nem apenas dando oportunidades de trabalho aos ‘excluídos’, como defende a “esquerda” – se resolve com uma combinação dos dois. Argumentos de direita? De esquerda? Não me interessa se são de um ou de outro. Isso é o que penso, apenas. Por favor, não votem em mim no dia 5.

    Não há nada mais chato, limitado e previsível do que um discurso “direitista” ou “esquerdista”. E eu não me canso de colocar estas expressões entre aspas, porque realmente não vejo mais valor para elas no mundo contemporâneo. A realidade pede mais. Tomemos o caso do partido que está no poder atualmente, aqui no Brasil. O PT tem um discurso “de esquerda”, mas o governo do presidente Lula é conservador (“de direita”). Lula combina política econômica que deixa feliz o mercado com programas sociais populistas – nada que governos anteriores já não tenham feito. No entanto, quando um jornalista critica os atos do presidente, por exemplo, é logo rotulado de “direitista”, de “representante da imprensa reacionária” (nós falamos sobre isso na entrevista com a Rosane de Oliveira). Bom, se esse governo realmente é “de esquerda”, alguém precisa dizer a Lula, já que ele mesmo afirmou, anos atrás, que não se considerava mais um homem “de esquerda”. E aí, como ficamos? Como se vê, o negócio não é tão simples.


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    Debate que se faz com base em “direita” e “esquerda” fica na superfície. Ir fundo é perceber que há aspectos a serem seriamente criticados nos dois lados. Ver Hugo Chávez expulsar da Venezuela representantes da organização de defesa dos direitos humanos Human Rights Watch, sob a acusação de que eles conspiravam com o governo americano para derrubá-lo, é desolador. Assim como é desolador saber das intimidações e maus-tratos sofridos pelos prisioneiros afegãos e iraquianos da base de Guantánamo, mantida pelos Estados Unidos. As duas práticas são arcaicas e inaceitáveis. Chávez é admirável? De modo algum. Bush é admirável? Também de modo algum. Triste é o mundo que tem duas figuras como essas. E estreita é a visão de quem defende um ou outro.

    O melhor dos mundos seria aquele onde as questões econômicas, sociais e políticas fossem solucionadas de forma pragmática, ponderada, sem puxões para a (aspas, de novo) “direita” ou para a “esquerda”. Onde as pessoas debatessem ancoradas em argumentos e fatos, e não em dogmas e distorções de um lado ou de outro. Quem encara a realidade como se ainda vivêssemos na época da Guerra Fria, com o mundo dividido entre capitalismo e socialismo, tem o pé no passado. Este tipo de pensamento já era. Muitos, porém, não percebem isso e ficam sempre no mesmo discurso. É preciso ir além. Se eu acho que as pessoas devem olhar para a direita ou para a esquerda? Nem um, nem outro. Devem é olhar para frente.


    lucas colombo assinaturaLucas Colombo

    Jornalista, professor, colaborador de revistas e cadernos de cultura, editor do Mínimo Múltiplo, organizador do livro "Os Melhores Textos do Mínimo Múltiplo" (Bartlebee, 2014).


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